A HIPOCRISIA ABRE BRECHA PARA A CORRUPÇÃO
Abner Henrique e Pedro Dornas deixaram de ser secretários para serem vereadores com a metade do que ganhavam antes, uma prova de que o poder de quem representa o povo é bem maior do que o de fazer parte do primeiro escalão do governo. A questão é o que fazer deste poder.Foto/Divulgação
Acho que o vereador de Nova Lima ganha pouco. R$ 8,7 mil. Liquido, é pouco mais de R$ 6,5 mil. Antes, era até muito, porque existia a verba indenizatória que chegou a R$ 10 mil/mês. Esta grana era de certa forma incorporada ao subsidio, porque bastava tirar notas de alimentação, de combustível e de pagamento de assessorias – em boa parte superfaturadas e/ou frias – para se obter o reembolso.
Esta verba não existe mais. Foi extinta pela legislatura passada. Restaram os cargos de assessores parlamentares como salários de mais de R$ 15 mil e de livre indicação do vereador. É claro que neste mato tem coelho. Como pode um empregado ganhar o dobro do patrão. A verdade é que, em muitos casos, a maior parte deste salário vai para o bolso do “chefe”.
Creio que este esquema ainda exista. Boa parte dos cargos altos foram extintos. Outros, reduzidos pela legislatura passada. Mas os marajás continuam, pela ausência de consenso contra, e isso infere que eles são de fato usados para engordar a conta bancária de quem os contrata. Pelo menos foi assim durante anos. O jeitinho brasileiro operando.
Espero que esta nova legislatura leve adiante a política de moralização da Casa, encabeçada pelo presidente Thiago Almeida, e acabe de vez com este insulto à inteligência do povo e à lei.
Na minha opinião, o subsidio do vereador deveria ser por isonomia, levando em conta o teto da Prefeitura, que é o salário do prefeito. Em Nova Lima, o chefe do executivo recebe cerca de R$ 35 mil. O do vereador deveria ser 40 a 50% deste valor. Acho que esta proporção é justa, já que o vereador é a segunda maior autoridade política do município.
É o que recebe hoje um secretário de governo que não foi eleito pelo povo e nem concurso fez para entrar na vida pública. Mas ganha mais do que o representante do povo. Dois exemplos práticos: os vereadores Abner Henrique e Pedro Dornas abandonaram o cargo de secretário para serem representantes do povo ganhando a metade do que quando chefiavam as suas pastas.
A explicação para isso é de que o poder de um vereador é muito maior do que o de um secretário, embora o tempo de permanência em ambos os cargos seja de quatro anos, com possibilidade de renovação. E poder é dinheiro!
A proposta, portanto, é a de acabar com gatilhos que estimulem o abuso de poder e venham a “engordar” o vencimento do vereador, porque faz parte do instinto do ser humano “tomar de, em falta de”. Ocorre que para se aumentar o vencimento do vereador ou do prefeito, é preciso da caneta destes –é a lei –mas, moralmente, é beligerante “legislar em causa própria”.
O rótulo é este. E como isso é impopular, os vereadores acabam congelando os seus vencimentos ao ponto de ficarem com os subsídios defasados por decisão própria do colegiados. E diante da hipocrisia imposta, um ou outro dá o seu jeito de corrigir os seus vencimentos “na marra”.
Por lei, um vereador de um município com mais de 100 mil habitantes pode receber até 50% do que ganha um deputado estadual. Em Minas, o subsidio do deputado é de R$ 33 mil. Ou seja, um vereador local tem o direito de receber R$ 15 mil. Nos municípios com mais de 500 mil habitantes, a proporção é de 75% do que ganha um deputado estadual.
Em Uberlândia, por exemplo, que tem mais de 500 mil habitantes, o subsídio dos vereadores é superior a R$ 20 mil. O maior do Estado. O teto no serviço público no Brasil é o dos ministros do Superior Tribunal Federal (STF), que é de R$ 44 mil. Nenhum servidor público pode ter um salário igual ou superior a este.
É preciso entender que a aplicação desta proporção terá que ser feita dentro de critérios bem rígidos para se evitar o que ocorre hoje em Nova Lima, onde um assessor parlamentar ganha quase o dobro do vereador. É necessário zerar qualquer possibilidade de se tirar proveito das brechas da lei.
O fim da verba indenizatória e a vontade política do presidente Thiago Almeida de moralizar a Câmara já é um avanço neste sentido. Infelizmente, não se pode acabar com os cargos comissionados. Eles foram criados para que pessoas de confiança do político possam ser contratados sem concurso público.
Funciona assim em todos os poderes políticos e seria uma hipocrisia dizer que isso é errado, porque não pode um vereador ou um prefeito ter em seu gabinete apenas pessoas do quadro efetivo. Elementos que, às vezes, ele nem conhece. Já a máquina administrativa, como um todo, deve ser tocada por concursados devidamente preparados para o seu perfeito funcionamento.
Neste aspecto, Nova Lima, com seus mais de seis mil servidores concursados, está muito bem servida. Os servidores públicos da cidade são extremamente preparados, especialmente na área da educação e da saúde. Menos mal.
